Paradigmas do Teatro na Antropologia

Descrição: As questões iniciais deste projeto de pesquisa (Produtividade em Pesquisa - PQ, protocolo 5387818717103034) surgem de uma tese de livre-docência, “De que Riem os Bóias-Frias? Walter Benjamin e o Teatro Épico de Brecht em Carrocerias de Caminhões" (Dawsey, 1999). Naquele texto, ao me deparar com algo que se apresentava como um teatro de "bóias-frias", tomei interesse pela inflexão do pensamento teatral na antropologia. Procurei entender princípios dramatúrgicos que possivelmente revelavam-se nas encenações cotidianas apresentadas em canaviais e caminhões. Chamava atenção o modo como dramas irrompiam nesses palcos. Em busca de meios para análise do teatro dos "bóias-frias", explorei alcances e limites das abordagens de Victor Turner e Clifford Geertz. Se a antropologia de Turner (cf. Dawsey, 2005) propiciava um desvio metodológico fecundo, me levando a focar manifestações que ocorriam ás margens da vida social, em momentos de suspensão de papéis, os dados etnográficos sugeriam um segundo deslocamento, para fins de discutir as margens das margens. Por sua vez, se Geertz (1978b: 316) demonstrava as possibilidades surpreendentes que uma etnografia dos gestos e da audição poderia oferecer - tendo por objetivo captar as "histórias que eles contam sobre si para eles mesmos" - a experiência de campo suscitava um interesse pelos ruídos nessas histórias, e pelos elementos suprimidos, ou em risco de serem esquecidos. Sob inspiração de Taussig (1980, 1986, 1993), interessei-me pelo pensamento crítico de Walter Benjamin. Os "bóias-frias" pareciam farejar, através do riso, uma história do esquecimento. Para compreender o que se passa nessas carrocerias de caminhões, talvez fosse realmente preciso realizar a tarefa benjaminiana de "escovar a história a contrapelo" (Benjamin 1985b:225). Num registro benjaminiano, sugeriu-se, "descrição densa" (cf Geertz 1978a) também vira uma "descrição tensa" - carregada de tensões - capaz de produzir nos leitores um fechar e abrir dos olhos, uma espécie de assombro diante de um cotidiano agora estranhado, um despertar" {Dawsey 1999: 64). O riso dos "bóias-frias" pode provocar um estremecimento. Também encontrei afinidades entre as tábuas dessas carrocerias de caminhões e os palcos sobre quais Brecht ensaiava um teatro épico e seus "efeitos de estranhamento". Trata-se, nos dois casos, de "uma prática que calcula o lugar olhado das coisas"  ̶  conforme a formulação sugestiva de Barthes (1990:85) para definir teatro. Nos dois casos, possivelmente, trata-se, como também disse Barthes (1984:194) - a respeito do teatro épico de Brecht - não tanto de uma semiologia quanto de uma sismologia, um "abalo sísmico" na "logosfera". Duas questões colocaram-se: 1. Reconhecendo as especificidades das abordagens de Victor Turner e Clifford Geertz, haveria, não obstante, entre esses autores uma afinidade fundamental que se revela no modo em que eles contribuem para a formação de um paradigma do teatro dramático na antropologia? 2. Haveria no pensamento de Walter Benjamin e dramaturgia de Bertolt Brecht perspectivas fecundas para o estudo de manifestações culturais que ocorrem às margens dos campos de visão de Turner e Geertz?

Docente responsável: John Cowart Dawsey